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As proteínas da membrana são alvos-chave para muitos medicamentos. Eles estão localizados entre o exterior e o interior das nossas células. Alguns deles, chamados de “transportadores”, movem certas substâncias para dentro e para fora do ambiente celular. No entanto, extraí-los e armazená-los para observação é particularmente complexo. Uma equipe da Universidade de Genebra (UNIGE), em colaboração com a Universidade de Zurique (UZH), desenvolveu um método inovador para estudar sua estrutura em seu ambiente nativo: a célula. A técnica é baseada na espectroscopia de ressonância de spin eletrônico. Esses resultados, recém publicados na revista Avanços da ciênciapode facilitar o desenvolvimento futuro de novos medicamentos.
Nos organismos vivos, cada célula é cercada por uma membrana celular (ou ”membrana citoplasmática”). Esta membrana consiste em uma dupla camada de lipídios. Ele separa o conteúdo da célula de seu ambiente direto e regula as substâncias que podem entrar ou sair da célula. As proteínas ligadas a esta membrana são chamadas de “proteínas de membrana”.
Localizadas na interface entre o exterior e o interior da célula, transportam várias substâncias através da membrana – para dentro ou para fora da célula – e desempenham um papel crucial na sinalização celular, ou seja, no sistema de comunicação das células que lhes permite coordenar seus processos metabólicos, desenvolvimento e organização. Como resultado, as proteínas de membrana representam mais de 60% dos alvos de drogas atuais.
Objetos difíceis de estudar
O estudo biofísico de sua estrutura – a organização espacial dos aminoácidos constituintes – é, portanto, essencial. Para caracterizá-los, os cientistas devem extrair essas proteínas da membrana celular em que se encontram e isolá-las de todas as outras proteínas. Uma vez extraídas, as proteínas de membrana não podem ser estudadas em soluções aquosas. Devem ser mantidos em soluções líquidas compostas por detergentes. Eles também podem ser inseridos em membranas artificiais chamadas “nanodiscos”, feitas de proteínas e lipídios, ou em membranas lipídicas puras.
De qualquer forma, essas estratégias os afastam de seu ambiente fisiológico e não permitem que seu funcionamento seja observado in loco. Proteínas fora de seu ambiente nativo podem mostrar propriedades estruturais diferentes, portanto, induzir ao desenvolvimento de drogas.
Um método revolucionário
Uma equipe liderada por Enrica Bordignon, professora titular do Departamento de Físico-Química da Faculdade de Ciências da UNIGE, em colaboração com Markus A. Seeger, professor associado do Instituto de Microbiologia Médica da UZH, desenvolveu um novo método para estudar membranas proteínas em ação nas células vivas; mais precisamente, nas membranas celulares internas da bactéria intestinal E. coli. Para conseguir isso, a equipe de pesquisa contou com uma “ferramenta” específica: nanocorpos.
“São fragmentos de anticorpos capazes de reconhecer e se ligar a um alvo específico, como um antígeno ou, no nosso caso, um transportador de membrana, de forma muito eficiente”, explica Enrica Bordignon. Os cientistas produziram artificialmente nanocorpos específicos para um transportador de membrana e os usaram para informar diretamente sobre sua estrutura. ”Inserido E. coli células, dois nanocorpos têm como alvo a proteína de membrana desejada na membrana interna da célula e se ligam a ela”, explica Markus A. Seeger. A equipe multidisciplinar também incluiu cientistas da Ruhr University Bochum (cluster de excelência RESOLV) e da Universidade de Osnabrueck, na Alemanha, e da Universidade de Southampton, no Reino Unido.
Novos alvos para certos medicamentos
De antemão, uma pequena sonda magnética (uma molécula carregando elétrons desemparelhados) foi anexada a cada nanocorpo. ”Quando dois nanocorpos se ligam ao transportador, podemos medir a distância entre as duas sondas magnéticas nas células usando nossos métodos EPR”, explica Enrica Bordignon. Esta técnica é chamada de ”espectroscopia de ressonância paramagnética de elétrons” (EPR) ou ”ressonância de spin de elétrons”. A distância medida está na faixa do nanômetro (um milionésimo de milímetro). ”Pela primeira vez, conseguimos obter uma imagem clara da conformação de uma proteína de membrana em seu ambiente real e pudemos acompanhar a mudança induzida quando modificamos um único aminoácido em outro”, entusiasma-se Enrica Bordignon.
”O desenvolvimento desta nova estratégia é o resultado de um excelente e desafiador trabalho em equipe entre nossos dois grupos na UNIGE e na UZH. Em particular, é a resiliência dos dois primeiros autores, Dra. Laura Galazzo (UNIGE) e Dr. Gianmarco Meier (UZH), que tornou este projeto um sucesso após cinco anos de pesquisa”, sublinha a investigadora.
Esta nova estratégia permite uma determinação precisa das propriedades das proteínas de membrana em seu ambiente direto. Oferece a possibilidade de entender melhor como essas proteínas transportam certas substâncias para dentro e para fora da célula. Este método também tem a vantagem de ser facilmente transponível para células de mamífero. Ele poderia então ser usado para entender melhor e, portanto, melhor direcionar as proteínas de membrana que rejeitam certas drogas anticâncer fora da célula e, assim, combater o fenômeno da resistência a múltiplas drogas.
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