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Um novo estudo liderado por pesquisadores da Harvard Medical School ilumina como o cérebro se torna consciente de que há uma infecção no corpo.
Estudando camundongos, a equipe descobriu que um pequeno grupo de neurônios nas vias aéreas desempenha um papel fundamental em alertar o cérebro sobre uma infecção por gripe. Eles também encontraram sinais de um segundo caminho dos pulmões para o cérebro que se torna ativo mais tarde na infecção.
O estudo foi publicado em 8 de março na Natureza.
Embora a maioria das pessoas fique doente várias vezes ao ano, o conhecimento científico de como o cérebro evoca a sensação de doença ficou atrás da pesquisa sobre outros estados corporais, como fome e sede. O artigo representa um primeiro passo fundamental para entender a conexão cérebro-corpo durante uma infecção.
“Este estudo nos ajuda a começar a entender um mecanismo básico de detecção de patógenos e como isso está relacionado ao sistema nervoso, que até agora tem sido bastante misterioso”, disse o autor sênior Stephen Liberles, professor de biologia celular no Blavatnik Institute em HMS e um pesquisador do Howard Hughes Medical Institute.
As descobertas também lançam luz sobre como os anti-inflamatórios não esteróides, como o ibuprofeno e a aspirina, aliviam os sintomas da gripe.
Se os resultados puderem ser traduzidos para humanos, o trabalho pode ter implicações importantes para o desenvolvimento de terapias contra a gripe mais eficazes.
Um estado de espírito infeccioso
O laboratório Liberles está interessado em como o cérebro e o corpo se comunicam para controlar a fisiologia. Por exemplo, já explorou como o cérebro processa as informações sensoriais dos órgãos internos e como as pistas sensoriais podem evocar ou suprimir a sensação de náusea.
No novo artigo, os pesquisadores voltaram sua atenção para outro tipo importante de doença que o cérebro controla: a doença causada por uma infecção respiratória.
Durante uma infecção, explicou Liberles, o cérebro orquestra os sintomas à medida que o corpo monta uma resposta imune. Estes podem incluir sintomas gerais, como febre, diminuição do apetite e letargia, bem como sintomas específicos, como congestão ou tosse para uma doença respiratória ou vômito ou diarreia para um problema gastrointestinal.
A equipe decidiu se concentrar na gripe, um vírus respiratório que é a fonte de milhões de doenças e consultas médicas e causa milhares de mortes nos Estados Unidos todos os anos.
Por meio de uma série de experimentos em camundongos, o primeiro autor Na-Ryum Bin, pesquisador do HMS no laboratório Liberles, identificou uma pequena população de neurônios embutidos no nervo glossofaríngeo, que vai da garganta ao cérebro.
É importante ressaltar que ele descobriu que esses neurônios são necessários para sinalizar ao cérebro que uma infecção por gripe está presente e possuem receptores para lipídios chamados prostaglandinas. Esses lipídios são produzidos por camundongos e humanos durante uma infecção e são alvo de drogas como ibuprofeno e aspirina.
Cortar o nervo glossofaríngeo, eliminar os neurônios, bloquear os receptores de prostaglandina nesses neurônios ou tratar os camundongos com ibuprofeno reduziu de forma semelhante os sintomas da gripe e aumentou a sobrevida.
Juntos, os resultados sugerem que esses neurônios das vias aéreas detectam as prostaglandinas produzidas durante uma infecção por gripe e se tornam um canal de comunicação da parte superior da garganta para o cérebro.
“Achamos que esses neurônios transmitem a informação de que há um patógeno ali e iniciam circuitos neurais que controlam a resposta à doença”, disse Liberles.
Os resultados fornecem uma explicação de como drogas como ibuprofeno e aspirina funcionam para reduzir os sintomas da gripe – e sugerem que essas drogas podem até aumentar a sobrevida.
Os pesquisadores descobriram evidências de outro caminho potencial para a doença, este viajando dos pulmões para o cérebro. Eles descobriram que parece se tornar ativo na segunda fase da infecção, à medida que o vírus se infiltra mais profundamente no sistema respiratório.
Esta via adicional não envolve prostaglandinas, a equipe ficou surpresa ao descobrir. Camundongos na segunda fase da infecção não responderam ao ibuprofeno.
As descobertas sugerem uma oportunidade para melhorar o tratamento da gripe se os cientistas forem capazes de desenvolver medicamentos que tenham como alvo a via adicional, disseram os autores.
Uma base para pesquisas futuras
O estudo levanta uma série de questões que Liberles e seus colegas estão ansiosos para investigar.
Uma delas é quão bem as descobertas serão traduzidas para os humanos. Embora camundongos e humanos compartilhem muito da biologia sensorial básica, incluindo ter um nervo glossofaríngeo, Liberles enfatizou que os pesquisadores precisam realizar mais experimentos genéticos e outros para confirmar que os humanos têm as mesmas populações de neurônios e caminhos vistos no estudo com camundongos.
Se as descobertas puderem ser replicadas em humanos, isso levanta a possibilidade de desenvolver tratamentos que abordem as vias prostaglandinas e não prostaglandinas da infecção pela gripe.
“Se você puder encontrar uma maneira de inibir os dois caminhos e usá-los em sinergia, isso seria incrivelmente emocionante e potencialmente transformador”, disse Liberles.
Bin já está investigando os detalhes da via não prostaglandina, incluindo os neurônios envolvidos, com o objetivo de descobrir como bloqueá-la. Ele também quer identificar as células das vias aéreas que produzem prostaglandinas na via inicial e estudá-las com mais profundidade.
Liberles está animado para explorar toda a diversidade de caminhos de doença no corpo para saber se eles se especializam em diferentes tipos e locais de infecção. Uma compreensão mais profunda desses caminhos, disse ele, pode ajudar os cientistas a aprender como manipulá-los para tratar melhor uma série de doenças.
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