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Em 2020, as editoras Hachette, HarperCollins, John Wiley e Penguin Random House processaram o Internet Archive (IA) por violação de direitos autorais, equiparando sua ‘Biblioteca Aberta’ a um site pirata.
A biblioteca do IA é uma organização sem fins lucrativos que digitaliza livros físicos, que podem ser emprestados aos clientes em formato de e-book.
Mantendo-se fiel ao conceito de biblioteca secular, apenas um usuário por vez pode obter uma cópia. Essas restrições foram temporariamente afrouxadas no auge da epidemia de Covid, quando o IA lançou a Biblioteca Nacional de Emergência.
Violação em massa de direitos autorais ou uso justo?
Os editores veem a biblioteca de IA como uma operação desonesta que se envolve em violação intencional de direitos autorais em massa, prejudicando diretamente seus resultados. Como tal, eles querem que seja removido permanentemente.
“Sem qualquer licença ou pagamento a autores ou editoras, a IA digitaliza livros impressos, carrega esses livros digitalizados ilegalmente em seus servidores e distribui cópias digitais integrais dos livros por meio de sites públicos”, diz a reclamação.
Os editores não são contra as bibliotecas em si, nem se opõem ao empréstimo de e-books. Ao emprestar conteúdo digital, as bibliotecas ‘autorizadas’ normalmente obtêm uma licença ou negociam termos específicos. O Internet Archive não tem essa licença.
O Internet Archive discorda totalmente das alegações de violação de direitos autorais. Enfatizando que a biblioteca oferece um serviço vital, a defesa do Internet Archive se concentra no conceito legal de uso justo.
O Arquivo afirma que fazer uma cópia digital de um livro físico ‘transforma’ o trabalho original antes de ser emprestado a um patrono de cada vez. Isso se qualificaria como uso justo, eles argumentam, especialmente porque não há fins lucrativos.
Outro fator a favor do uso justo é o fato de haver inúmeros benefícios para o público em geral. Também não há evidências que mostrem que as vendas das editoras de livros ou as receitas tradicionais de licenciamento foram impactadas.
Audiência do tribunal de Nova York
Nos últimos dois anos e meio, as partes têm ido e vindo no tribunal, disputando os argumentos uma da outra. Isso acabou resultando em moções contrastantes para julgamento sumário, com ambos os lados esperando uma decisão a seu favor antes do julgamento.
Ontem, IA e os editores tiveram a oportunidade de defender suas posições durante uma audiência no Tribunal Distrital de Nova York. Ambas as partes apresentaram seus casos e foram questionadas pelo Tribunal Distrital John Koeltl.
A advogada das editoras, Elizabeth McNamara, destacou que o IA se esforça para disponibilizar todo o conhecimento gratuitamente, mas não quer compensar os detentores de direitos autorais por suas obras.
“IA não quer pagar autores ou editores para realizar este grande esquema e eles argumentam que pode ser dispensado de pagar as taxas habituais porque o que eles estão fazendo é de interesse público”, disse ela, citada pelo The Register.
O advogado dos editores acrescentou que a plataforma de empréstimo do IA prejudica diretamente os autores e editores, mas o juiz Koeltl não viu nenhuma evidência direta de dano. O advogado de IA, Joseph Gratz, disse que não existem evidências de danos.
“Não há evidências de que os editores tenham perdido um centavo”, disse Gratz, conforme citado pela Ars Technica.
Reproduções não autorizadas
O teste de uso justo de quatro fatores que se aplica a esses casos não é direto, mas um relatório da Reuters destaca alguns comentários interessantes do juiz Koeltl.
Koeltl enfatizou que as bibliotecas têm absolutamente o direito de emprestar livros de sua propriedade, mas, neste caso, o IA vai um passo além ao fazer uma cópia digital, uma reprodução do trabalho original.
“Você evita a questão de saber se a biblioteca tem o direito de reproduzir o livro que, de outra forma, tem o direito de possuir, o que é realmente o cerne do caso”, disse Koeltl, observando que “o editor tem o direito autoral de controlar reprodução.”
O advogado de IA respondeu apontando que as reproduções servem a um propósito ‘transformador’ neste caso, acrescentando que todo caso de uso justo lida com cópias ou reproduções por definição.
Batalha pelas bibliotecas
O exposto acima é apenas uma fração dos argumentos jurídicos em discussão. Embora, em essência, esta seja uma disputa de direitos autorais sujeita à lei e à jurisprudência existentes, ela é um exemplo de um problema maior.
Os editores não estão apenas contra IA; um grande movimento público se formou em apoio. Isso inclui a campanha “Batalha pelas bibliotecas” da Fight for the Future, que argumenta que os editores agem como porteiros maliciosos, impedindo o livre fluxo de informações e minando a capacidade das bibliotecas de atender seus usuários.

A reclamação geral é que os editores querem controlar e restringir o acesso digital aos livros por meio de acordos de licenciamento relativamente caros. Isso serve a um propósito comercial, mas também pode ser usado para censurar conteúdo e restringir o acesso sempre que acharem adequado.
A questão também atraiu a atenção do fundador do Creative Commons e professor de Direito de Harvard, Lawrence Lessig, que descreve este como um momento crítico na história da cultura.
“O processo que o Internet Archive enfrenta determinará se o modelo de negócios da cultura é apenas o modelo comercial ou se continuará a haver lugar para as bibliotecas”, observa Lessig.
Os legisladores também se interessaram pela disputa. Alguns meses atrás, o senador norte-americano Ron Wyden e a congressista Anna Eshoo enviaram uma carta às principais editoras, perguntando sobre os termos restritivos de aluguel de e-books.
“Muitas bibliotecas enfrentam desafios financeiros e práticos para disponibilizar e-books para seus usuários, o que compromete sua capacidade de cumprir sua missão”, diz a carta.
“Entendemos que essas dificuldades surgem porque os e-books são normalmente oferecidos sob acordos de licenciamento mais caros e limitados, ao contrário dos livros impressos que as bibliotecas normalmente podem comprar, possuir e emprestar em seus próprios termos”.
Esses comentários mostram que este não é apenas mais um processo de direitos autorais. Quaisquer que sejam os resultados imediatos das moções pendentes e julgamento, este assunto provavelmente será contestado até a Suprema Corte.
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