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Como o cérebro adapta nosso comportamento em resposta a uma infecção ou lesão? Uma equipe multidisciplinar de cientistas do Institut Pasteur, CNRS e Inserm revelou a existência de um circuito envolvido na detecção e também na regulação da resposta anti-inflamatória orquestrada por diferentes regiões do cérebro. Este circuito detecta a inflamação no sangue e organiza e regula a resposta imune. Ele incorpora uma conexão bidirecional entre o cérebro e o sistema imunológico. Os resultados foram publicados em 5 de junho de 2023 na revista neurônio.
Sempre que ocorrem infecções ou lesões, o sistema imunológico é acionado para controlar a infecção e reparar o tecido danificado. Esse processo envolve a liberação de mediadores pró-inflamatórios que informam o cérebro sobre o estado imunológico do corpo e coordenam a resposta imune. Em resposta a esse sinal, o cérebro desencadeia uma reação complexa conhecida como “comportamento doentio”, cujo objetivo é reatribuir energia aos diferentes sistemas do corpo. Esse estado está associado a mudanças comportamentais, incluindo evitação social e letargia, ajustes metabólicos como febre e perda de apetite e liberação de hormônios como a cortisona, para aumentar a resistência à infecção e, ao mesmo tempo, regular as respostas imunes. Neste estudo, um grupo multidisciplinar formado por neurobiólogos e imunologistas do Institut Pasteur, do Inserm e do CNRS descobriu um novo circuito usado pelo cérebro para medir os níveis de inflamação no sangue e, em resposta a isso, regular a inflamação. Uma região do tronco cerebral conhecida como complexo vagal detecta diretamente os níveis e tipos de hormônios inflamatórios na corrente sanguínea. Essa informação é então retransmitida para neurônios em outra região do tronco cerebral chamada núcleo parabraquial, que também recebe informações relacionadas à dor e a certas memórias aversivas ou traumáticas. Por sua vez, esses neurônios ativam neurônios no hipotálamo levando a um rápido aumento da cortisona, um hormônio com propriedades anti-inflamatórias, no sangue.
Os cientistas usaram abordagens de neurociência de ponta para identificar esse circuito, o que lhes permitiu observar individualmente os neurônios envolvidos durante a inflamação. Os especialistas observaram como a atividade de neurônios específicos no núcleo parabraquial poderia regular a produção de glóbulos brancos envolvidos na resposta imune. “Esta pesquisa demonstra que a atividade neural no cérebro por si só pode ter um efeito poderoso no desenvolvimento de respostas imunes durante uma infecção ou lesão. Portanto, fornece um exemplo claro da poderosa conexão bidirecional entre o corpo e o cérebro. Também alimenta nossa ambição de descobrir o impacto do nosso cérebro na forma como interagimos com micróbios, combatemos patógenos e curamos feridas”, explica Gérard Eberl, chefe da Unidade de Microambiente e Imunidade do Institut Pasteur.
A descoberta deste circuito abre novas oportunidades de pesquisa que contribuirão conjuntamente para os campos da neurobiologia e da imunologia: “Este estudo nos fornece ferramentas adicionais para entender melhor o impacto da inflamação sistêmica em nosso cérebro, humor e em certos processos neurodegenerativos”, acrescenta Gabriel Lepousez, neurobiólogo da Unidade de Percepção e Memória (Institut Pasteur/CNRS).
Dado o papel estabelecido do núcleo parabraquial em processos de memória aversiva, potenciais ameaças infecciosas podem ser evitadas se este circuito for reativado pela memória de experiências inflamatórias ou aversivas passadas. Com base nessa comunicação neuroimune, o sistema imunológico poderia, portanto, se beneficiar da capacidade do cérebro de prever e antecipar ameaças em nosso ambiente.
Esta pesquisa foi financiada pelas organizações citadas acima e também pela AG2R-LA MONDIALE e MTRL.
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