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Tornou-se claro que um progresso significativo na mudança climática não será alcançado por uma pessoa ou, na verdade, por um governo. É necessária uma ação coordenada entre governos, indústria, lideranças locais e sociedade com urgência. A própria decisão recente da COP27 menciona a importância das comunidades locais, cidades, povos indígenas e crianças. Mas notavelmente ausente está o papel da fé ou da religião.
Aproximadamente 84% da população global se identifica com algum tipo de religião, número que deve subir para 87% até 2050. Nossa pesquisa mostra que a fé tem potencial para mobilizar mudanças socioambientais, mas geralmente é deixada de fora das conversas sobre sustentabilidade.
A religião pode ter uma influência significativa e positiva no comportamento das pessoas em relação ao meio ambiente. Práticas espirituais e liturgias estão sendo desenvolvidas para ajudar os crentes a integrar as preocupações ambientais com sua espiritualidade.
Duas publicações importantes são a encíclica Care for our Common Home, do Papa Francisco, e Zen and the Art of Saving the Planet, do mestre zen Thich Nhat Hanh. Ambos destacam a relevância das ideias religiosas para as crises ambientais e orientam as pessoas a viver de forma sustentável.
A fé pode ser uma força motriz por trás do investimento ambientalmente responsável. A organização FaithInvest ajuda instituições religiosas a usar seus recursos financeiros de forma ética e sustentável. Grupos religiosos também podem coordenar ações coletivas sobre o clima. Antes da COP27, líderes religiosos de todo o mundo publicaram uma carta pedindo o fim de novos projetos de combustíveis fósseis.
Claro, as mesmas influências podem e têm sido usadas para obstruir a ação sobre a mudança climática, e o compromisso institucional formal não se traduz necessariamente em ação pessoal. Nossa pesquisa ajuda a explicar como os mecanismos de crença religiosa podem ser usados para inspirar ações ambientais.
A fé e o planeta
Estávamos interessados em entender os processos de mudança pessoal e prática em direção à sustentabilidade entre os cristãos no Reino Unido. Estudamos as respostas ao livro da Quaresma de 2020 do Arcebispo de Canterbury, Saying Yes to Life, de autoria de Ruth Valerio. O livro apresentou perspectivas teológicas sobre a importância de cuidar do mundo natural, com foco nos desafios ambientais, como escassez de água, poluição do ar, degradação da terra, perda de biodiversidade e uso de energia.
Pesquisamos 133 pessoas de várias faixas etárias e origens da igreja antes e depois de se envolver com o texto e conduzimos grupos focais. Descobrimos que essa intervenção influenciou significativamente as crenças e o comportamento dos participantes em relação ao meio ambiente.
Depois de se envolver com o texto, as pessoas tiveram atitudes mais positivas em relação ao meio ambiente. A maioria relatou pelo menos um aumento de curto prazo em comportamentos pró-ambientais, particularmente em relação ao uso de energia, escolhas alimentares e reciclagem.
Enquadrar as questões ambientais em termos teológicos também influenciou as atitudes ambientais dos participantes. Eles relataram perceber a natureza como sagrada, sentindo-se mais conectados ao mundo natural e adotando a crença de que os humanos devem cuidar da criação.

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Identificamos três etapas pelas quais as pessoas passam quando sua fé é mobilizada para a ação. O primeiro passo é revelador, onde a natureza dos problemas ambientais e as crenças teológicas pré-existentes (como os humanos tendo o direito divino de dominar o meio ambiente) são iluminadas para o indivíduo. Para nossos participantes, isso ocorreu por meio da leitura cuidadosa do texto e da discussão com outros crentes.
O segundo passo é refletir. As pessoas então consideram como suas próprias crenças e estilos de vida podem precisar ser reconsiderados de acordo com novas ideias teológicas ou informações científicas.
A etapa final depende do grau de compromisso ambiental já assumido. Para aqueles cujos estilos de vida são incompatíveis com as novas informações, a etapa de redirecionamento descreve um processo de mudança interna (cognitiva ou espiritual) e externa (comportamental). Para aqueles que já buscam estilos de vida pró-ambientais, a etapa de reforço envolve fortalecer ainda mais esses compromissos.
Enfrentando a crise ambiental
Atualmente, muitas conversas sobre o meio ambiente são enquadradas pela economia – o triple bottom line (um conceito que incentiva as empresas a pensar no lucro, nas pessoas e no planeta), capital natural e investimento verde. Apelar para visões de mundo morais e espirituais pode inspirar as pessoas a pensar sobre o ambientalismo em termos de justiça, dever sagrado, compaixão, empatia e bondade.
Ter uma comunidade de fé que pode apoiar, reforçar e sustentar a ação ambiental é outra função crítica da religião. Muitos participantes mencionaram a esperança e a determinação que surgiram ao saber que faziam parte de um corpo maior de crentes cristãos trabalhando pela mudança.

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Apelar para visões de mundo baseadas na fé tem potencial para contornar divisões políticas e afiliações culturais que sufocaram a ação. De fato, nesta pesquisa, as maiores mudanças em relação à preocupação ambiental ocorreram entre os participantes que se autoidentificaram como politicamente conservadores.
A fé é fundamental para a visão de mundo de muitas pessoas. Nossa pesquisa mostra que a religião oferece uma oportunidade poderosa para inspirar ações ambientais. Mas há trabalho a ser feito em ambos os lados. Os líderes religiosos poderiam incorporar ainda mais as questões ambientais em seus ensinamentos e práticas espirituais, e os cientistas e formuladores de políticas poderiam se envolver mais com as pessoas de fé.
A capacidade da humanidade de evitar uma catástrofe ambiental dependerá da incorporação da sustentabilidade em todas as instituições e ambientes culturais. A religião não é exceção.
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